4.11.08

entrevista

O que espera da Arquitectura? E da (...)?

Da arquitectura não espero nada, pelo menos da "arquitectura" que hoje se concebe como "produto de marketing" desprovido de "orgãos","esqueleto", "musculatura" e "pele". Passou a ser na maior parte da sua expressão uma pele de papel, sem entranhas,que nem se movimentar e estar em contexto sabe.


E a quem culpar, a quem responsabilizar deste assassínio daquilo a que se chama arquitectura ou fazer arquitectura? As forças especulativas virtuais que estão mais interessadas em vender do que em garantir arquitectura, a falta de cultura de quem encomenda, a cultura descartável vigente, os arquitectos que facilmente se descartam desta usando argumentos e liguagens paralelas a esta? Não sei poderíamos falar da pressão que exercem os que "encomendam" o "produto arquitectura" , mas nós somos responsáveis por deixá-lo vender por tão "barato" , retirando-lhe toda a importância e complexidade que é "fazer arquitectura". Ora se encararmos o arquitecto como um técnico (atenção a parte artística encara-se como ofício, e não como desvario insano de pinceladas expressivas sobre um guardanapo de papel) assim como um médico é normalmente respeitado, o arquitecto devê-lo-ia ser também. Somos antes de mais técnicos supostamente com as ferramentas para acompanhar, aconselhar quem nos procura,"dar à luz","curar", "revitalizar" e "pós-modernamente" "ressuscitar histórias" de passados inventados. Ou seja somos supostamente capazes de ter uma visão crítica dos lugares, da arquitectura, de conceber, de conservar, de recuperar e de reabilitar. Portanto temos muitas responsabilidades sobre a imagem, a função, a forma como condicionamos ou libertamos espaços.


É interessante reparar, e apesar da minha ainda recente experiência no mundo do trabalho, que muitas vezes os arquitectos subjugam-se ao que se chama a "vontade do cliente" (senão pode desistir e procurar outro atelier). Mas assim como um doente não foge de um consultório quando lhe dizem os males de que padece (na maioria da vezes, não existem relatos sobre isso), uma pessoa que solicita o trabalho de um arquitecto também não o deveria fazer. Se o faz a culpa é do arquitecto, que não soube explicar como iria proceder, a importância do que ia fazer, ou muito simplesmente não soube perceber o que era pretendido (atenção que tentar perceber o que se pretende não significa "amputar" uma perna porque a pessoa pediu, quando vemos que é um acto completamente desnecessário).


Quais os programas que prefere para trabalhar?


Eu preferiria lidar com habitação unifamiliar ou multifamiliar. Desenhar espaços interiores, desenhar móveis adequados a um determinado espaço. Encarando a arquitectura mais como uma coisa global.

De qualquer forma estou pronta para trabalhar em qualquer coisa relacionada com arquitectura, é evidente que os programas se diferenciam muito uns dos outros e que a sua complexidade e especificidade depende do fim a que se destina, mas não é tudo arquitectura?


Que tipo de horário? Flexível? Fixo? Sem horário? Por objectivos? Com datas?


Na minha opinião penso que para os arquitectos o melhor sistema de trabalho é por objectivos e com datas, dado que na arquitectura as formas de trabalho não são lineares, embora devam ser sempre encaradas com disciplina. Sendo assim acho que um horário de funcionário público das 9 às 17h da tarde (o que nunca acontece num atelier, sejamos realistas) mesmo nos mais regrados, com folhas de horas e "polícias internos". Porque uma das partes será sempre incumpridora um dia o patrono outro dia o empregado. Porque o empregado às vezes chega tarde e sai cedo, e nem se preocupa com o que faz, ou sai tarde porque ganha à hora e cada hora é preciosa para pagar as contas. Pois bem isto está mais do que visto que não funciona, nem sempre o que passa mais horas num atelier é melhor ou produz mais ou melhor que os outros. Aliás se há um arquitecto que resolve qualquer coisa em meia hora e outro que faz a mesma coisa ou pior em três horas, pagamos melhor ao que esteve três horas a gastar tempo? Não sei, mas qualquer coisa de errado existe neste sistema que premeia o laxismo. Por isso o que cada um faz nos prazos que lhe são dados é com ele, mas os resultados têm de aparecer, assim é que a coisa deveria ser encarada. Existe um prazo e independentemente das horas que cada um precisa para resolver o problema isso já é com essa pessoa. Se ele gastará apenas um dia a trabalhar e nos outros vai de férias, isso é com ele. Se ele precisará de duas semanas e trabalhar de manhã à noite isso também é com ele. O que é necessário é estabelecer datas e cada um dentro desse período de tempo gere à sua maneira. E o que deve ser pago é o trabalho que fez, não as horas que passou a trabalhar ou a fingir que trabalhava. O que não deveria acontecer era existir sítios "ateliers" onde se vê claramente que uns fingem que trabalham, mas ficam lá a fazer horas para ganhar o "ordenado".



Qual a remuneração que pretende? Quais as condições?


Olhe isto hoje em dia não sei, mas há dez anos atrás os arquitectos saíam da faculdade, muitos não faziam sequer estágio e começavam logo a trabalhar a ganhar mil escudos à hora. Enfim dez anos depois pagar 5 euros à hora , para quem já trabalhou enquanto estudante, já fez dois estágios, é raro, quando acontece diz-se "Pagam-te bem!". Não sei como normalmente os estagiários não são pagos, ou dão-lhes o subsídio de alimentação, deixou-se de contratar arquitectos com pouca experiência.


Mas como disse também não concordo com o pagamento à hora desde que sejam delegados objectivos e tarefas, e quando o arquitecto que as cumpre em menos tempo não seja sobrecarregado com mais, porque outro colega seu "não deu conta do recado" ou "esteve a brincar". Por isso não sei mas se pensarmos num arquitecto como "freelancer" acho que devia ser sempre pago pelas tarefas ou trabalhos que cumpre.

Sem comentários: