13.2.09

O mundo a seus pés

Coisa ignóbil o fato sujo desprendido da cruzeta que se embala vazia dentro dos armários de vidro. Toca a música de elevador no i-pod ligado e esquecido no bolso descosido do vestido que se encontra por debaixo do fato. Está sujo e lamacento, tem buracos de traça comilona, que não se intimida com qualquer bola branca de naftalina. São muitos anos a snifar naftalina, muita experiência em cheiros estranhos, sem nunca perder a altitude de voo. E a luz não a baralha nasceu numa rua Nova Iorquina cheia de néons, que brilhavam sobre os passeios oleosos e escuros. Vive só, avaliando os armários por onde passa. Conhece os cantos de todas as gavetas das gavetas a que todos chamam apartamentos. Vê o bicho Homem chegar comer, ver coisas num caixote luminoso, falar com gente que não lá está (mais parecem loucos a falar sozinhos) e enfiar-se num compartimento da gaveta, para no dia seguinte abandonar a gaveta e depois voltar à mesma rotina. São felizes mas constantes o dia da traça que se reinventa em cada armário, escuro.

Marta Sousa Freitas (nas horas vagas a olhar para as paredes brancas)

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