12.11.09

"Porque é que este projecto não vem assinado?" "Ó menina isso é porque foi um arquitecto da CML que me recomendou este arquitecto."

A questão foi levantada no relatório da sindicância aos serviços de Urbanismo e centrava-se no facto de o ranking dos arquitectos que mais projectos apresentaram à CML em 2006 ter à cabeça duas jovens (uma com 31 anos e outra com mais três ou quatro), ambas “com ligações familiares ou outras a antigos técnicos do município”. Para além destas recordistas, que subscreveram mais projectos do que ateliers com “dezenas de trabalhadores”, havia entre os dez primeiros dois octogenários, um deles que tem presentemente 84 anos.Em meados do mês passado, Salgado adiantou que, afinal, o número de processos desses autores somava perto de 1200 no triénio em causa – sendo que o director municipal de Gestão Urbanística, Gabriel Cordeiro, corrigiu essa informação, reduzindo o número para cerca de 800, enquanto um mapa dos servicos contabilizava apenas 199. Há duas semanas, o mesmo director esclareceu em reunião de câmara que o número correcto andaria pelos 500, avançando uma série de explicações técnicas para tanta confusão.Embora a sindicância não tenha identificado os quatro arquitectos, o PÚBLICO localizou-os e confirmou os seus nomes junto de Gabriel Cordeiro. As explicações ouvidas depois da boca de dois deles e a fraca credibilidade das informações camarárias, que nem sequer distinguem a natureza dos processos, ou a área de construção que envolvem, fazem, porém, pensar que as constatações feitas na sindicância podem ter várias leituras, que nem sempre passam pelo tráfico de influências ou outras ilegalidades.Na perspectiva de João Rodeia todos estes factos reforçam a necessidade de “esclarecer cabalmente o assunto”, defendendo, como já tinha feito numa carta no PÚBLICO, “que os serviços da CML têm a responsabilidade e o dever de fazer cumprir a deliberação unanimemente aprovada pelo executivo”, porque “a dúvida não pode persistir” e “todos têm direito ao bom-nome” até prova em contrário.Anteontem, Rodeia acrescentou que, ao contrário do que Salgado antes afirmou, a Ordem nunca recebeu nenhum pedido de colaboração da câmara para reanalisar os processos em causa, razão pela qual não o poderia ter rejeitado “por falta de meios”, como disse o vereador. “Informalmente foi-nos pedido para colaborarmos com a câmara na área dos licenciamentos, mas sobre este assunto nunca falámos”, concluiu. Gabriel Cordeiro, por seu turno, insistiu em que, embora não tenha sido ele a fazê-lo, “foi feito um contacto informal com alguém dos órgãos directivos da Ordem [sobre a reapreciação daqueles processos]”, que também não sabe quem seja.Arquitectos visados dizem que a sindicância não retrata a realidadeFilha de um desenhador da CML já falecido e com dois familiares ao serviço da autarquia, com quem diz não ter quaisquer relações, uma das arquitectas apontadas como recordista insurge-se contra as suspeitas que o relatório lança sobre si e um irmão com quem trabalha. “Temos muitos processos porque somos jovens e modestos e fazemos de tudo: legalizações, restaurantes, esplanadas, propriedades horizontais, pequenos trabalhos que pouco têm a ver com arquitectura.” E o facto de o seu pai ter trabalhado no Urbanismo da câmara até há cinco anos e ter lá familiares não lhe facilita a angariação de clientes e a aprovação dos projectos? “De modo algum, basta ver as propostas de indeferimento que existem em muitos dos nossos projectos”, responde, ressalvando que o atelier que o pai teve “durante 40 anos” e a que deu continuidade tinha naturalmente a sua clientela. Em todo o caso, diz que aprova a ideia da Ordem de que os processos sejam reanalisados para esclarecer tudo. “Não receamos nada”, diz. Já a outra técnica, que foi a número um em 2006, o PÚBLICO não a conseguiu contactar, mas confirmou que trabalhava para o atelier Newspace, do arquitecto Jorge Contreiras, que se demitiu da CML no decurso da sindicância e foi há pouco acusado de corrupção e outros crimes pelo Ministério Público, devido à sua intervenção em processos de várias empresas suas. Quanto aos arquitectos octogenários, um deles confirmou que até há três anos assinava muitos projectos de restaurantes e bares – “coisas muitos simples” – que eram feitos por técnicos da CML que não os podiam assinar. “Não lhes levava nada, mas via se estava tudo bem”, salienta. “Além disso havia pelo menos um arquitecto na CML que falsificava a minha assinatura.” Segundo diz, o seu colega também octogenário “teve um AVC”, mas ainda “continua a assinar por outros porque está na miséria”.

in Jornal Público

9 comentários:

jraulcaires disse...

same old story...

Acho que para os projectos de Arquitectura deveria bastar o termo de responsabilidade, e, depois, tudo o resto devia ser pelouro da Ordem. Isso se tivesse-mos uma Ordem a sério.

Quanto muito as Câmaras zelariam pelo cumprimento das normas urbanísticas e demais instrumentos do ordenamento territorial. E, já é muito. Mas parece que o sistema que nós temos foi feito de propósito para dar azo a uma quantidade enorme de equívoquos.

Eu, pelo sim pelo não, quando vou à câmara vou sempre de "bola baixa"...

Mas quando é que acaba isto? - mais a mais, sabendo nós, em 30 anos de "democracia" o que é o poder autártico, o mar de corrupções que por aí vão, etc...

E só chegam aos jornais os grandes casos, não por exemplo o do funcionário que para aprovar um plano diz de chapa que quer ficar com os fogos para fazer ou ainda outras coisa mais miudas. Não se pode com isto.

Existem câmaras em que procuram por toidos os meios indeferir projectos só para ficarem com eles ou entregarem aos amigoss.

É uma vergonha. Devia acabar quanto antes.

Cumprimentos.

jraulcaires disse...

tivessemos, peço desculpa.

jraulcaires disse...

ainda bem que sou amigo de uma advogada. a minha advogada é meio louca mas é extremamente competente.

Marta disse...

Pois, hoje em dia tenho de dar a mão á palmatória, sem termos um bom apoio jurídico e nós próprios sermos conhecedores da kafkiana legislação e toda a parafernália em vigor, aprovada em assembleias municipais, regionais e da república, não nos safamos. É preciso andar com os olhos bem abertos...

jraulcaires disse...

Já agora...

http://www.euparticipo.org/lisboa/ordenamento/Nao-a-construcao-da-Igreja-Caravela-Restelo

Anónimo disse...

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jraulcaires disse...

Merry christamas and a happy new year. Cheio de arquitecturas e novas conquistas pessoais. Não deixar o desâmino prevalecer.

PS. este blog, não se actualiza?

Anónimo disse...

a mama ainda está viva. cofesso-me vítima de múltiplas corrupções na CML, das que nos deixam tolhidos e sem força para denunciarmos pois vemos o enorme peso da máquina que nos esmaga. srª economista que envia munícipes para o seu marido amigo (?) da onça - Mendonça, arquitecto da CML, para fazer orçamentos a peso de ouro...e que depois ainda pede mais para garantir aprovação, fiscais que pedem luvas, arquitectas que também as pedem (muito discretamente, pois). Uma coisa nojenta, que descredibiliza a profi~ssão, a instituição, a raça humana. Penas pesadas para os prevaricadores e responsáveis - é uma medida indispensável.

jraulcaires disse...

Gosto da expressão "menina"... - é tão vintage...